Nas edições anteriores vínhamos sempre abordando temas relacionados a doenças neurológicas, tais como seu diagnóstico, tratamento e prognóstico. Entretanto, nesta presente edição, pretendo dividir com os ilustres leitores desta revista um fato muitíssimo doloroso que vivenciei juntamente com uma equipe de profissionais da saúde, além de outras pessoas. Trata-se do caso de um paciente em especial pelo qual nutri um carinho peculiar e uma amizade sincera que me oportunizou o enorme prazer de estar ao seu lado em seus últimos anos de vida. Mas como contar a vocês em tão poucas linhas este caso? Vamos tentar.
Por volta do ano de 2012, em visita a uma das alas de determinado hospital, sou abordada pela enfermeira que passa a relatar o seguinte caso: “Dra.! Hoje internou um jovem rapaz de 30 anos, chamado JN, queixando-se de fraqueza nas pernas”.
Após examiná-lo e realizar vários exames, foi diagnosticada uma doença neurológica denominada Mielite Transversa (MT). Trata-se de um processo inflamatório agudo que afeta uma área focal da medula espinhal. Ela é caracterizada clinicamente por sinais e sintomas de disfunção neurológica em nervos motores, sensoriais, e autonômicos, e vias nervosas da medula espinhal que se desenvolvem agudamente ou subagudamente. Os sintomas podem progredir rapidamente dentro de minutos ou horas em alguns pacientes. Já em outros, tais sintomas podem progredir dentro de dias ou semanas.
A MT é uma doença rara, mas pode afetar pessoas de todas as idades (desde os 6 meses até os 88 anos) com um pico de incidência entre os 10 e 19 anos e entre os 30 e 39 anos, sendo que 1/3 ficam com poucas sequelas, e outros, com um mau prognóstico para recuperação.
No presente caso, esse jovem iniciou com queixa de dores nas costas e um leve amortecimento nas pernas (como ele mesmo dizia). Por outro lado, e infelizmente, os sintomas da doença avançavam rapidamente e, por conseguinte, graves sequelas foram desencadeadas e o acometeram. As intervenções de diversos especialistas se fizeram necessárias e o sofrimento e a angústia de JN, amigos e familiares contagiavam toda a equipe envolvida.
Num ato de desespero e também esperança, a família procurou buscar alternativas em outros serviços mais especializados, entretanto, sem qualquer êxito. Assim, entre tantas idas e vindas, JN retorna ao hospital, trazido nos braços, completamente debilitado, e ainda, dependente de aparelhos para poder respirar, de forma que passou, desde então, a ter como sua residência o próprio hospital, pois já não mais apresentava condições adequadas para retornar à sua casa.
Foi então que JN passa a enfrentar a maior e mais difícil batalha de sua vida. Entretanto, não de forma solitária, mas com toda uma equipe profissional envolvida, com fisioterapeutas, fonoaudiólogos, médicos, enfermeiros, assistentes sociais e técnicos e com o apoio e amor incondicional de seus pais, que passaram a residir ao lado do hospital para melhor assisti-lo diuturnamente. Por vezes, JN, quando podia, manifestava o desejo de degustar alimentos tão comumente consumidos por nós, tais como uma batata frita, um danoninho, um milk shake e outros gêneros alimentícios que sabidamente os nutricionistas extirpam de qualquer dieta em situações como a relatada. No entanto, não sei o porquê, insistentemente JN acabava tendo acesso aos mesmos (risos).
Infelizmente, apesar de toda dedicação e cuidados desprendidos, JN se foi e agora provavelmente se tornou um anjo que deixou um vazio impreenchível no coração daqueles que o amavam.
JN, sentiremos muita a sua falta, pois você foi um ser humano que nos cativou com seu carinho e nos ensinou a ter coragem e esperança naqueles momentos mais adversos de nossas vidas. Descanse em paz, amigo. Você jamais será esquecido.